terça-feira, setembro 30, 2014

Um filme de Lisboa

A mais recente realização de António Pedro Vasconcelos, Os Gatos não têm Vertigens, é um filme português sobre o nosso tempo, sobre as relações humanas, sobre a amizade e a solidariedade, sobre a devastação e pilhagem neoliberal e é também um belo filme sobre Lisboa.
Com Maria do Céu Guerra (Rosa), João Jesus (Jó), Nicolau Breyner (Joaquim), o filme conta a história de solidão de uma viúva recente (Rosa), que perdeu o marido (Joaquim) mas encontra um improvável amigo (Jó). Jó está a fazer 18 anos, vive numa zona “problemática”, uma existência “problemática”, tem amigos “problemáticos”, um pai “problemático” que o maltrata, explora e que o expulsa de casa no dia do aniversário. As voltas da vida levam o jovem Jó a refugiar-se no terraço da casa de Rosa. Ele reconhece que está no inferno mas tem a melhor vista do mundo. E o resto não conto. Vejam o filme.
A acção começa no grande salão de baile do Mercado da Ribeira e todo o filme se desenvolve em Lisboa. A casa de Rosa e o terraço ficam na encosta do Castelo de S. Jorge - mais rigorosamente na esquina da rua da Costa do Castelo com a calçada do Conde de Penafiel -, e a vista é de facto das melhores do mundo; no rés-do-chão do prédio onde vive, Rosa tem como vizinha a atriz Adelaide João. No interior do Castelo fica a mercearia (a patroa é a atriz Mariema); grande parte da ação passa-se na zona do Castelo, com o elétrico 28 às voltas  ali perto. O pai de Jó vive do outro lado da cidade, perto de Alcântara, sobre o final da Avenida de Ceuta, entre a Quinta do Cabrinha e a Rua da Cascalheira, e dali a vista dá para o lado das Necessidades. Para as suas atividades e ligações com os parceiros “problemáticos”, Jó desloca-se para o Cais de Sodré, onde frequenta um café mesmo sobre o rio.
Lisboa não é apenas cenário: é também protagonista no filme de APV. Outro protagonista é o Sport Lisboa e Benfica, transversal entre “bons” e “maus”, “problemáticos” ou não.

domingo, setembro 28, 2014

Suba, desça e diga 33

 Remédios


33 é o número de escadinhas na toponímia da cidade das Sete Colinas. 
Como o próprio nome indica não se trata de escadas nem de escadarias, menos ainda de escadote
As escadinhas são à escala dos becos e travessas da cidade com séculos de vida e de história.
Santo Estevão



Para subir e para descer, pelas escadinhas todos os santos ajudam. E assim há em Lisboa as escadinhas de São João de Deus, de Santa Amaro e de Santa Estevão, de São Crispim, de São Cristóvão e de São João Nepomuceno, de São Miguel, de São Tomé e do Santo Espírito da Pedreira. 
Da Porta do Carro

E como subir e descer a pé faz bem, há as escadinhas da Saúde e as dos Remédios mas também as do Quebra-Costas e as dos Terramotos. 
Há escadinhas da Liberdade, das Portas do Mar, das Escolas Gerais e das Olarias. 
E ainda há escadinhas do Arco de Dona Rosa ou escadinhas de Dom Gastão.
Como também há escadinhas do Terreiro do Trigo, ou da Porta do Carro. 




Da Saúde




Escadinhas da Cruz da Pedra:
sobem ao céu da boca









E como a máquina não anda sem combustível, também há escadinhas em nomes da restauração lisboeta, como seja a Floresta das Escadinhas, em Santa Justa, ou as Escadinhas da Cruz da Pedra, em Benfica.


A cidade sobe e desce, por sete colinas. O que vai valendo são as escadas e escadinhas. 

Chove? Nenhuma chuva cai... Fernando Pessoa

Um ou outro dia nublado, mas a regra é o Sol nas próximas duas semanas na cidade de Lisboa. Uma média de 23 graus de máxima e 16 de mínima, é a previsão para o mesmo período, com as máximas a chegarem perto dos 30 gruas para o final  da primeira semana de Outubro.
O arco-íris que apareceu sobre Lisboa na tarde da passada sexta-feira, queria mesmo dizer que a chuva concedia algum tempo de paz à cidade. 

quinta-feira, setembro 25, 2014

Consideremos o jardim…

Jardim Amália


Lisboa respira e o sistema respiratório de Lisboa dispõe de cerca de 80 jardins, 15 parques, três matas, seis praças, quatro campos, duas quintas e duas tapadas. Os espaços verdes preservam o ar, têm funções lúdicas e recreativas, são espaços de passeio e de namoro.


Jardim do Torel


«Fui ontem visitar o jardinzinho agreste, // Aonde tanta vez a lua nos beijou, // E em tudo vi sorrir o amor que tu me deste…», rima Cesário Verde.


«Alguém diz: 
// Aqui antigamente houve roseiras…», 
escreve Sophia de Mello Breyner. 
«Olha, ainda há flores…», 
observa José Gomes Ferreira.


Jardim da Estrela
Nos jardins de Lisboa também se passeia a solidão: 
«Num banco de jardim uma velhinha…», Carlos do Carmo na letra 
de Ary dos Santos.

«Consideremos o jardim, mundo de pequenas coisas,
calhaus, pétalas, folhas, dedos, línguas, sementes.
(…) É aqui, é aqui que se renova a luz.»

António Ramos Rosa, Volante Verde

quarta-feira, setembro 24, 2014

Lisboa quer plantar uma árvore por cada criança que nasça na cidade

A Bela-Sombra, do Largo do Limoeiro
A plantação de uma árvore por cada criança que nasça em Lisboa é uma das 212 propostas que a partir de agora estão à votação dos munícipes no âmbito do Orçamento Participativo de Lisboa. 

São 212 os projetos selecionados, de um total de 669 apresentados, e a Câmara tem uma verba de 2,5 milhões de euros para dar andamento às ideias mais votadas. A votação do Orçamento Participativo começa esta semana e vai até 6 de Novembro.
A instalação de postos de rádio que transmitam música e notícias pela cidade; requalificação de praças, ruas e espaços verdes; áreas de serviço destinadas a roulotes; autocarros de bairro; parques para carrinhos de bebés;
construção de um painel com grafiti para evocar o antigo Casal Ventoso; são alguns dos projetos em votação. O Parque das Nações é a zona da cidade com mais projetos a votação; a freguesia da Misericórdia - que integra as antigas freguesias da Encarnação, Mercês, Santa Catarina e São Paulo - não tem qualquer projeto. 

Informe-se e participe aqui

terça-feira, setembro 23, 2014

Chove no betão



Consta que já estão em curso estudos e análises para fazer o elenco das causas mais um dia de cheias em consequência de chuvadas intensas. Como este blogue tem um carácter eminentemente construtivo e visa contribuir, embora modestamente, para que lisboetas mais distraídos, sejam eles governantes, autarcas, gestores ou cidadãos anónimos, abram um pouco mais os olhos, deixamos uma pequena sugestão para a análise em questão e em que estamos. Se se quer de facto saber o que se passou, perguntem ao professor arquiteto Gonçalo Ribeiro Teles que anda há décadas a falar com toda a propriedade sobre o assunto.
Bem sabemos que as ideias de Gonçalo Ribeiro Teles não estão lá muito na moda, nestes tempos de cimento armado. O arquiteto fala de «ilhas de verdura» numa cidade refém do betão; fala de «hortas e quintais», numa cidade impermeabilizada com argamassa que substituiu quase todos os logradouros por espaços de estacionamento, caves, arrecadações, casas de máquinas e oficinas; fala em «trazer o campo à cidade» para uma sociedade de frequentadores compulsivos de centros comerciais; e fala em «circulação da água», numa cidade que põe cimento em cima de cada centímetro quadrado rimando urbanização com especulação e ambas com betão.

De maneira que quem não queira ouvir e ter em conta ideias, experiências e argumentos como os do arquiteto Gonçalo Ribeiro Teles não venha dizer que quer entender o que se passa em Lisboa de cada vez que chove um pouco mais. Sim, porque o que se passou já se tinha passado anteriormente e voltará a passar-se. Ribeiro Teles é que sabe.

Texto e foto Beco das Barrelas / D.R. 

segunda-feira, setembro 22, 2014

Lisboa na rota dos cruzeiros

Com lotação esgotada - 2.550 passageiros e mais de mil tripulantes – o navio Poesia, uma das 13 unidades da companhia MCS, largou de Lisboa – terminal de Santa Apolónia - na noite de sexta-feira para um cruzeiro pelo mediterrâneo: Lisboa | Barcelona | Marselha | Génova | Málaga | Casablanca | Lisboa.
Com mais de 293 metros de comprimento, de 32 de largura e de 59 metros de altura, o navio Poesia desloca mais de 92 mil toneladas, carregadas de luxo e requinte – mais de 1.200 camarotes e suítes, 16 decks, jardim ZEN, SPA, restaurantes e bares, cinema ao ar livre, piscinas, parque aquático - a uma velocidade média de 20 nós (37 km/h).

Um cruzeiro chamado Poesia
O navio voltará ao Tejo e partirá para novos cruzeiros com o mesmo destino ainda em Setembro e em Outubro.

Um luxo. Para quem possa e queira. 
E a verdade é que Lisboa está na moda das rotas dos cruzeiros. No mês passado registaram-se 52 escalas de navios de cruzeiro no porto de Lisboa, com um total de cerca de 82 mil passageiros desembarcados.

Fotos Joana Francisca, Texto João Francisco, 
Beco das Barrelas / D.R. 

domingo, setembro 21, 2014

O Fado chegou à janela

O Fado, que é vizinho das pessoas em Alfama, chegou à janela, no Largo do Chafariz de Dentro, e fez-se ouvir. 
À mesma hora, do outro lado da Rua do Jardim do Tabaco, o pianista Júlio Resende surpreendia o auditório. 
E surpreendeu tanto que alguns saíram depressa da esplanada do Museu do Fado ao perceberem que aquele fado não era o que esperavam. Mas o fado do pianista Júlio Resende é admirável, sobretudo quando interage com a voz de Amália e principalmente no fado Medo (poema de Reinaldo Ferreira, música de Alain Oulman).
Na Igreja de Santo Estevão, junto ao cruzeiro do adro,
houve em tempos guitarradas... 


O pianista tocava com a torre da igreja de Santo Estevão pelas costas, na noite em que o Festival Alfama rendia tributo a Fernando Maurício, o Rei, onze anos após a sua morte. Fadistas populares cantaram em homenagem a Maurício enquanto o público pensaria na falta irreparável que Maurício faz ao fado. O Centro Cultural Dr. Magalhães Lima - local da homenagem - é um edifício magnífico, mas com tetos daquela altura não há voz nem guitarras que não se percam em ecos e reverberações.

Não se pode ver e ouvir tudo mas o segredo é escolher palcos pequenos e nomes selecionados. 
No palco grande, Jorge Fernando cantou como ele muito bem sabe, enquanto cantou fados; Carminho usou a sua voz magnífica num festival de trinados, gorgeios, requebros, voltinhas e floreados, estilando até à exaustão: dela própria e de parte do público.


A não esquecer: O Festival Alfama terminou mas o Fado continua, todos os dias e todas as noites em Alfama e outros bairros de Lisboa.
Fotos Joana Francisca, Texto João Francisco, 
Beco das Barrelas / D.R. 

sábado, setembro 20, 2014

O Fado ganhou uma fadista

Na Fonte do Poeta, Rua da Judiaria, em Alfama
 Lenita Gentil apresentou-se no Festival de Alfama, na noite de 19 de Setembro. E num Festival com algumas desilusões, bem se pode dizer que o Fado ganhou uma fadista. A veterana cantora, descoberta nos anos 50 pelo maestro Resende Dias, aderiu ao fado e a canção urbana de Lisboa ganhou uma voz que sabe cantar como poucas, como sabe ultrapassar e até tirar proveito dos seus limites. Quem a ouviu cantar fados do repertório de Lucília do Carmo, ou da autoria de Artur Ribeiro, Max, Arlindo Carvalho, ganhou a noite.

Lenita Gentil com o mestre Joel Pina
E diga-se que o Festival Alfama deu grandes oportunidades aos milhares de espectadores para perder a noite. 
A atuação de Ana Moura numa parceria com António Zambujo resultou numa frustração para quem queria ouvir a fadista. 
Alguém devia dizer ao guitarrista de Ana Moura, o talentoso Ângelo Freire, como lhe diria Alfredo Marceneiro, para não se «armar em saliente»: o fadista não pode ir atrás do guitarrista, numa correria para ver se consegue encaixar o poema do fado no acompanhamento. 
Ricardo Ribeiro perdeu uma excelente oportunidade para estar calado quando aproveitou o palco para dirigir referências acintosas a Camané – ausente este ano do programa. 
O horário e elenco dos palcos pequenos – onde reside o charme de Alfama e onde vai o público mais seletivo do Festival -, deviam respeitar a programação anunciada.

(continua para o segundo dia)
A não esquecer: Para além deste Festival, uma vez por ano, Alfama tem Fado todos os dias.
Fotos Joana Francisca, Texto João Francisco, 
Beco das Barrelas / D.R. 

domingo, setembro 14, 2014

O Tejo em Pessoa

Olho e Tejo, e de tal arte
Que me esquece olhando,
E súbito isto me bate
De encontro ao devaneando –
O que é ser rio, e correr?
O que é está-lo eu a ver?

Fernando Pessoa

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia, 
mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia 
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia
Alberto Caeiro


Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
Ricardo Reis 

Outra vez te revejo - Lisboa e Tejo e tudo...
Álvaro de Campos 

Fotos Francisco João / Beco das Barrelas / D.R.

quarta-feira, setembro 10, 2014

Do cotovelo da Terra à pestana do Mundo...

FERNÃO MENTES? VOLTA À CENA
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33 anos após a estreia, a Companhia de Teatro A Barraca repõe a peça “Fernão Mentes?”, adaptação de Hélder Costa da “Peregrinação” de Fernão Mendes Pinto. Como então se dizia, “'Fernão Mendes Pinto somos nós'. Como agora ainda diz Hélder Costa, “Um pouco como nós todos, não é?”

Com uma nova montagem mas com o mesmo texto, baseado no monumento da literatura mundial que é a “Peregrinação”, “Fernão Mentes?” mantém a música original de José Afonso, Fausto Bordalo Dias e Orlando Costa que fez o grande espectáculo musical dos anos 80. Em cena mantêm-se dois dos actores do elenco de há 33 anos, Maria do Céu Guerra e João Maria Pinto.

Em cena no Cinearte, em Santos,
Quinta a sábado – 21h30, Domingo – 17h

Grande Final: Quando às vezes ponho diante dos olhos...

Quando às vezes ponho diante dos olhos
A lusitana viagem medonha que eu dobrei
Os tormentos passados e os fados que chorei
Arde o corpo em oração entre pecado e perdão
Agonia o coração e arde o corpo
Do cotovelo da terra á pestana do mundo
Fui treze vezes cativo dezassete vendido

(Fausto Bordalo Dias, Por este rio acima)

segunda-feira, setembro 08, 2014

Mobilidade em Lisboa

Passeios e conferências integram a Semana Europeia da Mobilidade em Lisboa, de 16 a 22 de Setembro, com atividades em toda a cidade que visam promover meios de transporte alternativos.
A iniciativa é da Comissão Europeia, sendo organizada na capital portuguesa pela Câmara de Lisboa.
O objetivo é promover alternativas de transportes “mais sustentáveis”, como é o caso dos transportes públicos, da bicicleta ou da caminhada, afirmou à Lusa o diretor municipal de Mobilidade e Tráfego da autarquia, Tiago Farias.
Segundo Tiago Farias, Lisboa “está no caminho certo” para inverter a situação de grande aumento da taxa de motorização, “mas ainda tem um longo percurso a percorrer para chegar ao objetivo de ser uma cidade sustentável”.
Falta sobretudo uma rede de transportes públicos de qualidade e uma mudança dos comportamentos dos munícipes, assinalou o responsável, referindo que é nesse sentido que é importante criar iniciativas como a Semana Europeia da Mobilidade.
Isto é, falta quase tudo mas há uma Semana da Mobilidade, com passeios pedonais e de bicicleta, conferências e atividades ao ar livre. A semana termina com o Dia Europeu Sem Carros, no dia 22, no qual os munícipes são desafiados a ir de bicicleta para o trabalho.
A iniciativa do Dia Europeu sem Carros começou a ser seguida em Portugal em Setembro de 2000. Nesse ano, às oito da noite do “Dia sem Carros”, as televisões exibiram ministros, autarcas, gestores e outras personalidades a circularem de metro, autocarro, carro elétrico, bicicleta, trotinete, de patins e mesmo a pé. No ano seguinte, já de patins calçados, o governo da época deixou cair a iniciativa à qual, aliás, os automobilistas já não achavam graça nenhuma. E, daí por diante, o “Dia sem Carros” passou a ser meramente simbólico. 

A mais antiga iniciativa de Lisboa sem carros data de 1686. D. Pedro II mandou gravar em pedra e implantar na Rua do Salvador, uma transversal entre a Rua das Escolas Gerais e a Rua de São Tomé, uma determinação para regular a circulação e as prioridades de coches, seges e liteiras, que geravam com frequência situações de confronto na zona. 
Será a mais antiga placa de sinalização de trânsito de Lisboa e ainda lá está: 
Anno de 1868: Sua Magestade ordena que os coches, seges e liteiras que vierem da Portaria do Salvador recuem para a mesma parte.